quinta-feira, 11 de outubro de 2007

O Grande Sonhador - Parte 2


Depois do fracasso com a CBS, eu e Gene nos encontramos todos os dias para discutir Star Trek. Concordamos que deveria ser tratada como episódios em que a história já tivesse acontecido. Como uma narração através dos diários de bordo. Chegamos até a mudar o nome de Star Trek para Viagens de Gulliver e o nome do capitão seria Capitão Gulliver.

Mais tarde, Gene apareceu com ar de desespero e eu também o olhei com desespero. Tínhamos chegado à mesma conclusão. Narração: “Sim!” Viagens de Gulliver: “Não!”.

Quem sabe? Bill Shatner poderia ter sido Capitão Gulliver e as seqüências da série original teriam sido Viagens de Gulliver: A Próxima Geração e Viagens de Gulliver: Deep Space Nine.

Em vez de Trekkies, teríamos tido “Gullies”. Certamente a mudança do nome foi uma sábia medida.

Com este conceito de diário de bordo e com os personagens mais definidos, agora nos preparamos para ir para a próxima Rede de TV. A escolhida foi a NBC.

No início de Maio de 1964, Gene e eu nos dirigimos para o escritório da NBC em Burbank para nossa reunião. Era a costumeira reunião das Redes de TV: 50% conversa mole, 25% fofocas de TV, e 25% de negócios. Eu comecei falando sobre a série, explicando as estórias e personagens. Gene ficou sentado, com certo entorpecimento, como se tivesse cansado e tonto de uma viagem de volta de Alfa Centauro. Jerry Stanley, Vice-Presidente de Programação, queria saber mais sobre a estória-piloto. Pedi para Gene explicar. Ele fez um resumo sobre a premissa de “The Menagerie”.

Todos os diretores da NBC estavam convencidos de que não seria uma série comercial, que não haveria muita audiência Ambos os diretores, Grant Tinker e Jerry, eram meus amigos e se não conseguíssemos uma aprovação antes que saíssemos da sala, nunca conseguiríamos.

Jerry se levantou para terminar a reunião. “Olha, Herb, deixe eu conversar e discutir com Grant e depois eu te telefono.”

Gene se levantou para sair. Eu disse a ele para sentar e perguntei a Jerry. “Jerry, muitas vezes vocês tem que apostar em alguma coisa que valha a pena. Certamente, Star Trek é uma aposta, mas vale a pena arriscar. Também é uma aposta para Desilu, uma grande aposta. Se não funcionar, todos teremos perdido, mas teremos perdido por fazer algo que valeu a pena. E se você nos der um compromisso para um script de 90 minutos em vez de 1 hora, e fizermos o piloto, você poderá lançar como um programa especial e recuperar seu investimento se não gerar uma série. Além disso, eu não vou sair daqui sem que você nos dê uma pedido de script.”

Grant sorriu. “O que você vai querer para jantar?”

“Qualquer coisa que vocês quiserem.” Falei sorrindo.

Depois de alguns minutos de silêncio, Jerry disse com um sorriso. “Solow, você é mesmo um pentelho.”

“Eu sei,” respondi. “Isto quer dizer que conseguimos a aprovação, Jerry?”

Ele olhou para Grant. Grant sorriu. Jerry concordou com a cabeça.

“Obrigado, Jerry; faremos um grande trabalho para vocês.”

Enquanto Gene e eu nos dirigimos de volta ao estúdio, marcamos aquele dia como o começo de Star Trek. Não sabíamos que levariam quase 3 anos de ansiedades e frustrações antes que a série Star Trek debutasse na NBC.

A NBC tinha muitas dúvidas se a Desilu conseguiria lançar algo como Star Trek. Ela pediu mais explicações, mais estórias. Gene explicou a eles, usando uma nova técnica. Em vez de reforçar alguns aspectos, levantar o tom de voz, ele decidiu falar mais devagar e quase a sussurrar as palavras. Logo, os executivos da Rede começaram a sentar na ponta da cadeira para tentar entender o que Gene estava dizendo. Ele se tornara o centro das atenções na sala. E funcionou tanto que Gene usou esta técnica para sempre.

O piloto que a NBC escolheu era chamado de “The Cage” (A Jaula) e a partir daí Gene começo a escrever o script. A realidade chegaria quando o script estivesse pronto, a realidade do dinheiro. Era fácil para Gene criar um “canhão de laser”, o duro era ir para a próxima loja de ferramentas ou de armas e comprar uma. De alguma forma, daríamos um jeito.

Gene e eu fomos para a NBC para mostrar a eles o script e ouvir seus comentários. Ele se ofendia com a maior parte deles, às vezes desnecessariamente. Algumas idéias eram muito boas. E um novo lado de Gene apareceu lentamente: a propriedade de idéias. Se uma boa estória ou sugestão viesse de quem fosse, NBC, Desilu, do agente de atores, Gene Roddenberry as apropriava. A síndrome “são todas minhas idéias” iria afetar o relacionamento de Gene com muitas pessoas em Star Trek: redatores, compositores, atores, agentes, editores, diretores de arte, produtores e a mim. Alguns anos depois, Bob Justman cunhou um nome para ele. “ O Grande Pássaro da Galáxia”. Ao passo que Gene continuava a absorver idéias e conceitos de outros, eu iria jocosamente dizer a Gene que ele era realmente “O Grande Mata-Borrão da Galáxia”. Parecia mais apropriado.


BOB: Provavelmente porque ela nunca interferiu com sua série, Gene sempre falava bem de Lucille Ball. Contudo, houve muita especulação quanto ao envolvimento de Lucy no desenvolvimento de Star Trek.


HERB: Em reuniões de diretores da Desilu, Lucy raramente me fazia perguntas, ficando satisfeita em ouvir seus executivos discutindo os negócios da empresa. Mas uma vez em destas reuniões, por minha surpresa, quando eu estava para começar uma apresentação, Lucy interrompeu-me.

“Herb?”

“Lucy?”

“Herb, o que está acontecendo com a série dos Mares do Sul?”

“Como?”

“Você sabe, Herb, aquela série dos Mares do Sul que você mencionou da última vez.”

“Série dos Mares do sul? Opa, Lucy, gostaria de lembrar, mas não me lembro desta série. Vocês está querendo...?”

“Herb,” Lucy interrompeu, com um leve toque de raiva na voz, “é claro que você comentou sobre a série dos Mares do Sul. Aquela com os artistas que iam entreter as tropas durante a guerra!”

Olhei para os demais na sala. Todos olhando para mim, indicando para eu responder a pergunta. Tentei ficar calmo, enquanto Lucy ficava mais nervosa.

“Lucy, talvez seja algo que eu tenha esquecido, mas por Deus, eu não me lembro de ter mencionado nenhuma série com artistas visitando tropas nos Mares do Sul durante a 2ª Guerra Mundial!”

“Oh, sim, você falou. Você falou sim!”

Fiquei sem palavras, tentando lembrar o que eu poderia ter esquecido, quando Lucy, tendo lembrado mais sobre o assunto, de repente falou, “Oh, sim você falou, Herb. Você chamou ela de Star Trek ! “ (aqui uma explicação brasileira: Star pode significar estrela de cinema, artista e Trek viagem, daí a alusão de Lucy). Depois que expliquei melhor para Lucy, ela reconheceu o engano e posso entender que no mundo de Lucy, Star Trek, viagem de estrelas, poderia ter significado o que ela havia mencionado. E Mares do Sul era um lugar tão bom como outro qualquer.

Depois que o script foi terminado por Gene, houve várias alterações por sugestões da NBC e Desilu. Após alguma certa espera, a NBC comunicou que havia aprovado a realização do piloto. A NBC, a arqui rival da CBS de Lucy, tinha posto fé na Desilu e em Star Trek. A contribuição financeira da NBC seria considerável. Após Oscar ter feito a comunicação a todos os membros da diretoria da Desilu, as famosas perguntas:

“O piloto vai custar mais dinheiro do que eles nos darão?”

“Sim, o piloto vai custar mais do que ele nos darão de dinheiro.”

“Quanto mais?”

“Não iremos saber antes de terminar o orçamento do script. Mas custará mais.”

“Podemos fazer este tipo de série?”

“Claro que podemos!”

“Tem certeza?”

“Claro que tenho certeza.”

A diretoria estava tensa. A produção de um piloto de ficção científica de 90 minutos era um negócio caro e arriscado. Nós estávamos na arena de grandes nomes; Universal, Warner, Fox, MGM, United Artists, Paramount, Screen Gems (Columbia Pictures). Enquanto eu respondia mais perguntas, tentando manter uma postura positiva o melhor que pude, eu desesperadamente queria que todos ali presentes fizessem um círculo de mãos dadas e repetissem comigo, “Pai Nosso, que está nos Céus...”

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